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22 de outubro de 2011

Pedro Mourinho,“Não escondo a ambição de ser pivô na SIC generalista”

O jornalista foi o primeiro rosto da SIC Notícias, canal onde está desde 2001. Tem o desejo de passar a tempo inteiro para o canal generalista, mas quer ainda dedicar-se à criação de conteúdos. E garante que a liberdade que sente na redacção da SIC vale mais do que dinheiro.

Como chegou à SIC?

Há onze anos estava na RTP e vim a convite do Nuno Santos e do2011-10-21131907_CA967162-B341-4FEB-88DD-FECB0766BF67$$738d42d9-134c-4fbe-a85a-da00e83fdc20$$896b5ad7-dd49-49cb-b217-df54a6dd055b$$img_carrouselTopHomepage$$pt$$1 Emídio Rangel para integrar a equipa de fundação da SIC Notícias. Havia uma incerteza imensa, porque era o primeiro canal de informação em Portugal, não sabíamos se ía correr bem, ter sustentabilidade financeira para singrar, ter espectadores. As coisas estavam muito bem estabelecidas, o mercado não se movimentava muito, havia a RTP, a SIC e a TVI, o cabo estava a dar os primeiros passos. Acabou por se revelar um grande sucesso, portanto foi uma aposta ganha e uma óptima escolha a nível pessoal e profissional.

Foi a primeira cara da SIC N. Como se prepararou para esse momento?

Da mesma forma que todos o fizemos enquanto equipa da SIC N. Integrámos o projecto em Junho de 2000, e o canal só arrancou em Janeiro de 2001. Durante todos esses meses fomo-nos preparando, vestindo a pele de jornalistas a quem, a partir de dia 8 de Janeiro de 2001, a vida iria mudar substancialmente, porque alguém dizia, com razão, que a SIC N era um avião que ía levantar voo e nunca mais aterrava. Mas foi uma escolha de quem dirigia a SIC, porque ainda não se tinha percebido se o canal ía arrancar à noite ou na edição da manhã, que ía fazer com a Ana Lourenço e a Alexandra Abreu Loureiro. Coube-me esse momento que é, de facto, um grande momento na carreira de qualquer pessoa que integre um projecto destes. Percebe-se que, a partir daí, se faz parte da história da televisão em Portugal. Por muitos anos que viva e por muitas coisas que faça, o arranque da SIC N será muitas vezes o momento pelo qual serei lembrado.

O que o marcou mais nesse instante?

Há um elemento de grande responsabilidade porque nada pode falhar. O que me recordo mais é da ansiedade e expectativa de todos os colegas no momento em que o canal arranca. Sentir que naqueles segundos tudo correu bem, ouvir uma série de aplausos, porque na altura a redacção da SIC N funcionava atrás do estúdio e estava cheia, ninguém dormiu nessa noite, estávamos todos lá para apoiar. Era importante ter um grande arranque, para que as pessoas olhassem para o primeiro dia da SIC N. Quem ligou a SIC N naquele dia certamente não se sentiu defraudado. Era um canal de notícias de âmbito internacional, estávamos em  todo o lado onde estava a acontecer alguma coisa nesse dia. Além do mais tínhamos uma notícia que era só nossa, uma investigação a propósito das radiações por urânio empobrecido, que eram deixadas pelos bombardeamentos da Nato no Kosovo, era o grande assunto do momento, e levou todas as rádios a citarem-nos nessa manhã e os jornais a fazerem manchete no dia seguinte com a nossa história. Foi um dia perfeito para a SIC N, que nenhum dos outros canais de 24 horas de informação que está no mercado e que surgiram depois conseguiu até hoje. Esse é o ponto fundamental de partida: nós somos assim, vamos ser assim a nossa vida toda, somos sérios e profissionais, apesar de muito novos e estamos aqui para servir as pessoas.

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A decisão de ter uma equipa jovem foi consciente para associar a um canal novo a uma equipa nova?

Quando me foram buscar, e à Clara de Sousa e Ana Lourenço, já trabalhava há muitos anos na televisão. Era um cocktail perfeito, porque se juntaram pessoas que, sendo profissionais há uma série de anos, eram novas e havia um compromisso de futuro com elas, ainda tinham potencial de crescimento mas já eram valores muito seguros e talentos emergentes que podiam assegurar o futuro do canal. Houve a preocupação de mostrar, num projecto novo, pessoas novas, mas também caras que eram os novos valores dos canais generalistas, sobretudo dos concorrentes, e isso deu ao canal outra credibilidade.

Mas havia o compromisso de que essa juventude se reflectisse numa informação mais irreverente e arrojada?

Procuramos isso todos os dias, quer na SIC quer na SICN. Não fugir ao nosso compromisso com os telespectadores com uma informação rigorosa, séria, independente, mas ao mesmo tempo procurando sempre novos caminhos. E há uma série de gente aqui que é muito boa nesse papel. A esse nível a SIC é a grande televisão em Portugal. Costumo dizer que quando estava na RTP tinha um grande fraquinho pela SIC e é verdade, julgo que todos os jornalistas de televisão em Portugal o têm.

Que ingredientes fazem da SIC Notícias diferente?

As pessoas que aqui trabalham. A meu ver são os melhores profissionais de TV do País. Existe muita autonomia e liberdade criativa. As chefias confiam muito nos profissionais que aqui trabalham e dão-nos oportunidade de mostrar e poder ser irreverentes, de apostar e arriscar. E é assim que se vai conseguindo chegar mais além. Depois, a nossa redacção é um sítio onde se respira liberdade. Coordeno jornais na SIC há muitos anos e nunca senti a mínima forma de pressão e isso é muito importante. Podemos não ser os mais bem pagos do mercado, mas isso vale muito dinheiro.

Enquanto jornalista, do que é que abdicou para se dedicar à coordenação?

Apliquei-me mais na função de pivô, mas muitas vezes faço grande reportagem ou reportagem no exterior, e gosto imenso. Mas quando surgiu a oportunidade de coordenar e ao mesmo tempo criar conteúdos não a desperdicei. Desenhei o ‘Jornal da Meia-Noite’ (JMN), o ‘Primeira Página’, alguns dos espaços da SIC N, participei no início de ‘O Dia Seguinte’ e ‘Tempo Extra’. É algo que me agrada muito fazer, criar jornais a partir do nada, fazer algo diferente, com um cenário diferente e conteúdos mais irreverentes, com uma componente de imagem mais forte.

Trabalhando na SIC e SICN, como faz a ligação entre os dois canais?

São independentes, mas a redacção funciona em conjunto. A dada altura foi colocada a hipótese de assumir a coordenação e apresentação do ‘Primeiro Jornal’ de fim-de-semana. Não é fácil, primeiro em termos de tempo, porque nos obriga a uns horários muito estranhos. Mas a SIC tem muitos pivôs capazes de assumir o ‘Primeiro Jornal’ ou o ‘Jornal da Noite’, e isso é bom para quem manda, mas foi um passo natural de carreira. Quem aqui trabalha, também quer que o seu trabalho tenha uma visibilidade diferente e que o canal generalista, naturalmente, tem. Mas gosto imenso de o fazer porque é como andar na corda bamba todos os fins-de-semana, ou todas as noites e isso também nos dá alguma adrenalina.

Não está cansado de tantos anos no ‘JMN’?

O ‘JMN’ é importante para mim, uma espécie de filho. Faço parte da mobília, não me sentiria bem em deixá-lo, porque existe uma ligação quase sentimental. Se me perguntar se gostava de ser pivô a tempo inteiro na generalista, não vou esconder essa ambição. Mas o importante é sentir-me parte da equipa que faz a informação da SIC.

E que outras áreas gostava de desenvolver?

Trabalhar na SIC N é estar sempre a postos para qualquer coisa. O último trabalho que fiz de reportagem exterior foi no temporal da Madeira, há um ano e meio, estava a coordenar o ‘Primeiro Jornal’, aquilo aconteceu num sábado de manhã, mandaram-me para lá e todos nós queremos estar dentro desses momentos, porque é aliciante. E estou aqui sempre a postos para ser enviado para onde for preciso, para o fim do mundo.

Mas há gostos pessoais e áreas que um profissional se sente mais à vontade para desenvolver. Qual é a do Pedro?

Gosto de apresentar, de fazer reportagem, mas o que gosto de facto é de criar. Criar conteúdos, jornais, programas de informação. Essa é a minha grande valência. Provavelmente é a que as pessoas menos conhecem, mas é o que gostava de continuar a aperfeiçoar.

No fundo, é um trabalho de bastidores.

É , mas depois torna-se muito visível. Como pivô visto a pele do jornal que estou a fazer, é como vestir umas calças ou um casaco que me assentam de forma perfeita, como a minha roupa. Se coordenar e apresentar um jornal que foi concebido por mim, é o ideal. Não deixo de ter visibilidade por causa disso. As pessoas não são obrigadas a saber que fui eu que criei o jornal, mas ele está lá, mesmo que não seja eu a apresentá-lo.

E quando vê outros pivôs a apresentar num cenário seu?

Gosto de estar também no papel de espectador, de perceber o que funciona melhor e pior, o que pode ser corrigido. É quase avaliar o meu próprio trabalho.

Em onze anos, o que mudou na SIC N?

Mudámos nós, que estamos mais velhos. Demos consistência e credibilidade à SIC N, o que alguns no início achariam difícil de alcançar. Fomos sempre líderes de audiências, apesar de existirem mais 50 canais no cabo, outras duas estações concorrentes, que tentaram sempre chegar ao nosso patamar de audiências e por alguma razão não conseguiram. Isso quer dizer que as pessoas continuam a dar preferência à SIC N. Nada mudou, mas fomos construindo um caminho sério de confiança em relação às pessoas e a quem nos vê.

Muitos duvidaram do resultado de um canal de 24h diárias de informação, em português. Ficou surpreendido com a apetência dos portugueses por notícias?

A SIC N mudou a forma como a comunicação e como as notícias se processam em Portugal. Era algo que a rádio já fazia mas com menos impacto. A SIC N conseguiu pôr os políticos a comunicarem uns com os outros, na reacção pronta logo às 8 da manhã, sobre a notícia do dia. Não era algo habitual e foi também muito importante para criar hábitos nos espectadores. Alguém que compra o jornal da manhã lê determinada notícia, mas sabe que se ligar a SIC N já vai ter uma reacção de alguém a quem a notícia diz respeito.

Quais foram os momentos mais importantes?

O arranque da SIC N foi um dia em cheio, de emoções fortes e o concretizar de um marco profissional. Todo o primeiro ano, repleto de acontecimentos, desde o 11 de Setembro, a queda da ponte de Entre os Rios, o início da guerra no Afeganistão, o massacre de Fortaleza... Parecia que todos os dias acontecia algo de grande impacte noticioso. Pessoalmente, há várias histórias que me marcam. A morte do Miki Feher, porque foi algo que toda a gente tinha acabado de ver, em directo na tv, e ninguém tinha percebido o que tinha acontecido, a não ser que algo de muito mau se tinha passado. Estava a trabalhar, e foi uma noite de expectativa para mim e para os telespectadores, para saber o que tinha acontecido com aquele jogador do Benfica. Acho que todos quisémos que ele tivesse conseguido sobreviver e ultrapassar aquele momento, e no fim a notícia não foi essa. Ainda hoje, quando penso nisso, causa-me angústia, mas a notícia tinha que ser dada. Já está longe, e não me lembro todos os dias, mas em termos de carreira foi um momento forte para mim.

Houve outros momentos em que teve que forçar o distanciamento, e ser apenas a pessoa que dá a notícia?

Isso fazemos todos os dias, porque todos os dias há imagens que nos chocam, somos humanos. Seja cá ou lá fora, somos confrontados diariamente com histórias de miséria e amargura, de dramas terríveis, de crime e acidentes. Mas também há o outro lado, de histórias que nos fazem sorrir e ter esperança. Quando entramos, o lado emocional fica lá fora e aqui a nossa tarefa é informar, dar as notícias com rigor, isenção e imparcialidade. Mas também não acho que a apresentação de telejornais deva ser totalmente objectiva, há sempre um lado grande de subjectividade, isso deve ser dado a perceber aos espectadores, porque eles também reagem ao que estão a ver. Mas por regra, o jornalismo televisivo, tal como qualquer outro, deve ser objectivo.

A nível de investimento técnico, o que é a SIC tem hoje para oferecer?

Hoje, com a internet, podemos fazer directos a partir do momento em que temos uma ligação de dados, em qualquer ponto do mundo, de forma muito autónoma, basta carregar uma mochila às costas. Fazer directos em movimento era algo que não era possível há três anos. Estamos a caminhar muito rapidamente para o HD, os cenários virtuais estão a ser aperfeiçoados e são quase perfeitos, o ‘JMN’ é inteiramente virtual. Lembro-me de que quando fui para a televisão, o chrome era uma novidade, e nem sequer tinha profundidade, era uma parede verde onde se podia projectar uma imagem e a pessoa aparecia à frente. Tecnicamente, nem sequer era perfeito. Hoje, basta desenhar o cenário que se quiser, e isso sente-se na informação, porque existe uma limitação física de estúdios, de espaço, e é a possibilidade de, no mesmo sítio, termos cenários diversos.

Mas a técnica só veio melhorar e facilitar o trabalho do jornalista?

Sim, é um bom aliado. Quando fui para a RTP, as equipas de reportagem tinham um repórter de imagem, um assistente de áudio, motorista... hoje uma equipa de reportagem é um jornalista e um repórter de imagem. E conseguem, em reportagem no exterior, fazer o trabalho, editar, enviar, e isso foram avanços permitidos pelo avanço da tecnologia, porque cada vez temos mais meios para fazer melhores coisas.

A técnica não desvirtuou parte do trabalho do jornalista?

Não, a investigação e pesquisa faz-se da mesma forma, mas para a TV, e até imprensa e rádio, é muito mais fácil trabalhar de forma mais rápida. Ganha-se em tempo e penso que também em qualidade. É mais fácil rectificar trabalhos. O jornalismo só teve a ganhar com o avanço da técnica e vai ter seguramente ainda mais a ganhar.

A SIC N foi a primeira, há onze anos, mas hoje temos a RTP Informação e a TVI 24. Ainda faz sentido mais um canal de informação?

Acho que não. O mercado é muito limitado. A verdade é que eles existem há uma série de anos, e se existem é porque o mercado diz que podem existir, mas não acho que faça muito sentido, e a longo prazo vai sobreviver aquele que tiver mais audiências e a maior capacidade de dar a imagem de confiança às pessoas, e que é a SIC Notícias.

Os outros dois ficam pelo caminho?

Não sei muito bem o que vai acontecer na televisão, parece que vão privatizar uma licença da RTP. Isso não é fácil para o mercado e obviamente para nós, SIC e TVI é mau. Não vivemos da ajuda do Estado e se houver mais um player no mercado isso significa que haverá menos dinheiro no bolo publicitário. E a televisão com menos dinheiro para ser produzida será mais barata e de pior qualidade. Não é bom para os espectadores, nem para quem tem as televisões. Não sei como vai ser o futuro, mas quantos mais canais de informação surgirem, pior para todos.

No grupo Impresa as dificuldades são públicas. Os constrangimentos afectam o trabalho?

Afectam, mas o nosso objectivo é superarmo-nos todos os dias e fazer sempre mais com menos. Temos a consciência de que o País está a atravessar uma crise imensa, dentro de uma conjuntura internacional que não é nada fácil, e acho que toda a gente, não só aqui, se capacitou disto: trabalhar mais e fazer melhor, com menos. E o menos é,naturalmente, menos dinheiro.

No caso da SIC é também com menos pessoas, porque houve um processo de rescisões. Isso sente-se na redacção?

O importante é que os espectadores não o sintam, e que o trabalho continue a ser feito com a qualidade de sempre e isso tem sido conseguido.

O futuro do Pedro passa em exclusivo pela SIC?

Pela SIC, sim. Gosto muito de trabalhar aqui. Não posso dizer que desta água não beberei, mas da forma como as coisas estão, a SIC é a minha estação, vesti a camisola e é aqui que quero fazer a minha carreira, porque sinto, sobretudo, que o que tenho aqui é uma carreira a desenvolver. Que já vai a meio, mas que chegará mais longe, e não sei que qualquer outro lugar me poderia dar isso.

E onde é que poderá chegar?

Apesar  de pensar em termos individuais, integro-me numa equipa e o que quero é fazer parte de uma estação de sucesso. O meu desejo final é que SIC consiga sair desta crise e depois voltar à liderança.

Recebeu convites para ir para a TVI 24 ou para a RTP Informação?

Não.

E se surgissem?

A SIC é a minha estação. Poderia ponderar, mas a redacção é um sítio onde se respira liberdade e isso é muito importante.

Não sentiu isso na RTP?

Não senti a autonomia que as pessoas podem ter aqui, isso nunca senti, nem essa liberdade de poder fazer e criar. No meu tempo era complicado, mas não sei como as coisas estão agora.

PERFIL

Nascido em Lisboa a 30 de Abril de 1972, Pedro Mourinho formou-se em Jornalismo na Universidade Autónoma, mas estreou-se na RTP aos 18 anos. Foi o rosto de ‘Caderno Diário’, mas é sobretudo conhecido por ter sido a primeira cara da SIC N a chegar ao ecrã dos portugueses. Após onze anos em Carnaxide, diz que, além do 11 de Setembro, o momento mais marcante foi a morte do jogador do Benfica Miklós Fehér, em 2004. “Ainda hoje me causa angústia, mas a notícia tinha de ser dada”, recorda. “Quando entramos, o lado emocional fica lá fora, mas também há sempre um lado subjectivo na apresentação de telejornais”.

CM

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