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31 de março de 2012

"O jornalismo está muito centrado em Lisboa"

Bernardo Ferrão e Anselmo Crespo recebem, hoje, Rui Santos e Marques Mendes. Os anfitriões do programa da SIC Notícias 'Conversas Improváveis' contam como surgiu a "sala de estar improvisada".  No último sábado de janeiro, numa sala improvisada, dois jornalistas da SIC sentaram-se para mediar um debate improvável: Ricardo Araújo Pereira frente a frente com Marcelo Rebelo de Sousa. O arranque do programa da SIC Notícias Conversas Improváveis não podia ter sido mais auspicioso (foi o programa mais visto do ano na TV de informação de Carnaxide e está entre os sete mais populares de sempre do canal do cabo). Colegas de trabalho e amigos de longa data, os jornalistas contaram à NTV como passaram da ideia à prática: "Pensámos criar um programa de tertúlia, de conversa, mas algo que fosse um pouco diferente ao vivo, com público, que saísse do formato do frente-a-frente. Queríamos um formato que desconstruísse o habitual modelo que estamos habituados a ver e que juntasse duas pessoas que nada tivessem que ver uma com a outra", explica Bernardo, coadjuvado por Anselmo Crespo: "A ideia não é nem nunca foi juntar inimigos. Nós não queremos juntar duas pessoas que não se respeitem só porque isso poderá fazer bem nas audiências", explica o jornalista de economia que está há dez anos na SIC. Bernardo Ferrão, nascido no Porto, e Anselmo Crespo, natural de Leiria, tinham desde início um ponto de honra para o arranque de Conversas Improváveis: o programa tinha de ser feito fora de Lisboa. Leiria recebeu as primeiras duas edições (Ricardo Araújo Pereira/Marcelo Rebelo de Sousa e José Cid/ Manuel Alegre. A Figueira da Foz será palco do terceiro). "Nós não somos de Lisboa, viemos para cá trabalhar há alguns anos e também achamos que a televisão não tem de passar toda por Lisboa. Achámos que era importante descentralizar e levar o mundo e as pessoas da televisão para fora da capital", explica Bernardo Ferrão. Ferrão e Crespo são dois dos rostos mais conhecidos do jornalismo televisivo português. Especializaram-se ambos em política e economia, duas áreas que, fruto das circunstâncias que o País atravessa, são a pedra-de-toque dos noticiários. "O jornalismo nas nossas áreas, está muito centrado em Lisboa. Mas acho que isso é um reflexo do País", conta Bernardo, opinião corroborada por Anselmo. "A área económica está erradamente centrada em Lisboa. A economia real não é Lisboa, mas está centrada na capital porque os protagonistas estão em Lisboa. Mas aí é a ação e a consequência. Se os políticos saírem de Lisboa, nós, jornalistas também saímos de Lisboa.

'Improváveis' por uma boa causa

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Conversas Improváveis resulta de uma parceria entre a revista Invest e a SIC. As receitas dos bilhetes da plateia revertem a favor de várias instituições de solidariedade escolhidas pela SIC Esperança. "Achámos que o programa podia ter esse lado mais humano. Não é muito, é uma receita de 200 lugares, mas é o que podemos dar. E os convidados ficam muito contentes com esse lado solidário", explica Bernardo Ferrão. No final do programa, a "sala de estar improvisada" onde os jornalistas recebem os convidados também será convertida em solidariedade, como explica Anselmo Crespo: "Os sofás onde nos sentamos são assinados, a cada edição, pelos convidados. No fim vão ser leiloados e o valor vai ser entregue a uma instituição de solidariedade social".

Amanhã será a vez de Crespo e Ferrão se sentarem entre o comentador desportivo Rui Santos e o político Luís Marques Mendes. Os fãs do programa têm sido afoitos a sugerir parcerias improváveis e nem os anfitriões pensam noutro assunto. "A coisa em que mais pensamos, até temos sonhos, é com duplas [risos]", brinca Bernardo Ferrão, revelando qual seria a parceria de sonho: "Era giro juntar José Mourinho e Mário Soares."

Anselmo e Bernardo são dois rostos facilmente reconhecíveis da informação da estação de Carnaxide. Habituaram os telespetadores a mostrar o lado mais sério da notícia, mas não receiam o registo mais descontraído de Conversas Improváveis: "Acho que o programa não pisa a linha", garante Bernardo. Anselmo alinha pela mesma bitola: "O percurso da SIC, desde que apareceu, é sempre muito mais arriscado do que o convencionado. E nós somos produto dessa escola. Arriscar não significa transpor a linha. Não me parece que o nosso papel de jornalistas saia diminuído por fazermos um formato diferente." Novidade para os dois jornalistas foi estarem cara a cara com uma plateia ansiosa por assistir a um diálogo improvável entre algumas das caras mais conhecidas da vida pública nacional. "É diferente, apesar de tudo, de falar para uma câmara. Quando falamos para uma câmara, falamos para um milhão de pessoas, mas não as vemos. É diferente de falar para uma plateia que reage, que sorri, que fica séria", explica o jornalista de economia.

Um 'chef' e um 'marketeer'

Com consciência do momento difícil que o País atravessa, Bernardo e Anselmo são sinceros quando afirmam que a perspetiva do desemprego, uma sombra que paira sobre a cabeça de todos os portugueses, também lhes ocupa o pensamento. "Não tenho medo de ficar sem trabalho. Isto não é pretensiosismo nem presunção. No limite, terei sempre trabalho. Se não for nesta profissão, será noutra. Mas seria hipócrita dizer que não me assusta", diz Anselmo Crespo. E se não fossem jornalistas, de que viveriam os dois rostos da SIC? "Eu adoro cozinhar", confessa Bernardo Ferrão. "Serias cozinheiro?", indaga Anselmo, curioso. "Não sei se seria cozinheiro, mas adorava ter um negócio, um restaurante, um pequeno hotel. Mas é um hobby. Não sei se seria uma profissão." Já o leiriense via-se a mudar a vida para o marketing. "Gosto de marketing, gosto muito da área do domínio das ideias que, felizmente, é muito compatível com a área do jornalismo, que vale muito pelas ideias. Eu gosto da área criativa."

E porque é de improbabilidades que falamos, quisemos saber qual foi a pergunta mais improvável que a dupla fez no exercício da profissão. Bernardo Ferrão, que já foi apelidado pelo ex-primeiro-ministro José Sócrates de "insuportável", considera que "não há perguntas improváveis". E nem o facto de algumas figuras políticas o considerarem incómodo tira o sono ao jornalista da SIC. "Se me consideram... não é coisa que me preocupe muito, sinceramente", diz, acrescentado: "Nunca me telefonaram a dizer isso." Já Anselmo dá um exemplo caricato: "Uma vez ia a correr atrás de alguém que não queria responder e perguntei-lhe pelo resultado da bola, na brincadeira."

Na memória de ambos ficou o receio da pergunta que colocaram a Ricardo Araújo Pereira e Marcelo Rebelo de Sousa no arranque de Conversas Improváveis. "Estávamos um bocadinho receosos de perguntar se já tinham fumado um charro", conta Bernardo. "Era uma pergunta que nunca faria a um político, mas, ali, no programa, há espaço para isso", acrescenta.

Crespo e Ferrão confessam que nunca foram alvo de pressão política ("se a pressão são os célebres telefonemas, pressão para escrever num determinado sentido, a resposta é não", afirma taxativamente Ferrão), e que a exigência faz parte da profissão que escolheram. "Se a pressão é fazer uma pergunta incómoda, ter uma reação má, mas ter a certeza da pergunta que se está a fazer... então essa pressão existe. Mas isso comes with the job", diz Anselmo.

 

 

NTV

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