A jornalista da SIC que anda de mochila às costas por Portugal revela que sonhava ser pintora e que a sua ida para a SIC aconteceu por causa de um anúncio perdido num táxi.
Quando vemos Teresa Conceição em reportagem nos noticiários da SIC, há, por norma, um cenário idílico como pano de fundo. Já alguma vez sentiu que é vista como a jornalista que anda sempre a viajar?
É uma coisa que acaba por ser a minha matéria de trabalho e os meus colegas até costumam gozar comigo e dizem que ando sempre na boa vida. Mas esta coisa da boa vida demora muito mais tempo a ser trabalhada. É um bocadinho como ver um jogo de basquetebol e achar que aquilo é uma coisa muito leve, sem imaginarmos as horas de treino que estão por detrás. E, apesar de essa ser a parte do meu trabalho que tem mais visibilidade, também faço peças sobre denúncias e coisas menos boas da vida, por assim dizer.
Numa altura de vacas magras, acha que suas reportagens podem ajudar os espectadores a esquecer por momentos as palavras crise e troika?
Não sei. A mim o que me motiva é continuar a encontrar pessoas e a sua forma de estar na vida. E gosto muito de divulgar o que de melhor encontro no País e nas pessoas, e espero que isso possa servir de inspiração ou contágio. É como se fosse uma descarga de energia, espero que os espectadores sintam essa motivação. Há tantas coisas más... que falar de coisas boas acaba por ser a notícia. Há tão pouca paciência para tudo o que corre mal, que as minhas reportagens podem acabar por trazer alguma leveza.
É importante que num noticiário haja esse balanço entre notícias mais sérias, por assim dizer, e outras mais descontraídas?
O que gosto de facto de fazer é comunicar, e a melhor maneira que encontrei foi aliviar um bocadinho a linguagem. As notícias têm uma carga muito pesada e são ditas com uma linguagem muito formal, muito gravata. E eu não sou nem de gravata nem de formalidade.
Quando está em viagem o que é que não pode faltar na bagagem?
Curiosidade. E também não me posso esquecer de levar o meu livro de desenhos. Em viagem não vou para sítios muito frequentados por turistas, prefiro lugares com menos massas. Os meus destinos de eleição são a África e a Ásia. Sento-me num mercado africano a desenhar e de repente já tenho uma data de pessoas à minha volta a fazerem poses, a defenderem-me de tudo e mais alguma coisa, a quererem ser os meus guias. É um grande meio de ligação com as pessoas. E aqui, em Portugal, sinto isso quando vou fazer reportagens em aldeias mais retiradas. As pessoas não se julgam dignas de notícia e acham estranho que a TV queira falar com elas, mas esse momento de atenção é importante e, por vezes, nós, jornalistas, acabamos por ser psicólogos das pessoas.
O facto de trabalhar num registo mais descontraído nunca a levou a ponderar saltar para o mundo do entretenimento como fez Conceição Lino, por exemplo?
Estou o mais feliz possível, não gostava nada de passar para o entretenimento. Pode dizer-me que aquilo que faço tem muito mais entretenimento do que outra coisa, mas criei estes programas que podem parecer que são outra coisa mas são muito informativos. Quando imaginei o Ir É o Melhor Remédio foi para falar de coisas que normalmente não são faladas nas notícias, como a normalidade dos dias. Mas isto que parece ser entretenimento não é. Exige muita pesquisa e muito trabalho. Mas daí a saltar para o entretenimento... Virgem Santa!
Entretanto, já está na SIC há 21 anos. Há casamentos que duram menos...
Agora que fala nisso, realmente, este é daqueles que não se dá pelo tempo passar porque o meu trabalho é muito diversificado. É daquelas perguntas que eu própria me faço. Como passo pouco tempo fisicamente na redação, ando sempre a "laurear a pevide", como eles dizem, não tenho a sensação de estar na mesma empresa há tanto tempo. E o bom ambiente faz que o trabalho não seja tão pesado, mesmo quando trabalhamos 12 ou 13 horas por dia e em feriados, como qualquer jornalista.
Na Grécia, a televisão pública passa por momentos de grande instabilidade. Tem acompanhado o processo?
Não tenho acompanhado de forma pormenorizadas, mas é claro que fiquei chocada. E tanto pode ser televisão como qualquer outra empresa. Imagine ficarmos sem a EDP, como é que íamos viver? E sendo televisão é claro que é uma coisa que me toca particularmente porque é como se eu me pudesse rever ali.
Rever-se no sentido de que algo semelhante pudesse vir a acontecer em Portugal?
Imaginar que uma coisa semelhante podia acontecer em Portugal é algo que nos deixa a todos atarantados. É claro que é um grande atentado à democracia, é cortar a voz a quem tem o poder de a dar. Mas também serve para estarmos alerta porque a Grécia parece estar só um passinho à frente. Com tudo o que já aconteceu à RTP isto faz-nos ficar com um grande nó na garganta.
O jornalismo, de resto, tem sido uma área muito penalizada pela crise. Teme pelo futuro da profissão?
Acho que a profissão nunca vai estar ameaçada. Não é por se fechar um jornal ou um canal de televisão que o jornalismo vai deixar de existir. Agora que as empresas possam começar a ter problemas tão graves que cada vez haja mais jornalistas no desemprego, isso de certeza.
É possível fazer jornalismo de qualidade com cada vez menos recursos?
É uma tarefa cada vez mais complicada. O facto de termos de fazer cada vez mais coisas em menos tempo faz que tenhamos menos tempo para pensar e que elas não fiquem tão bem. Aquilo que podemos fazer, e que tem acontecido na redação da SIC, é que haja cada vez mais entreajuda. Mas isso acontece em todas as profissões. É o trabalho geral que está a ser posto em causa. Mas as pessoas têm sempre a tendência de dizer: "Olha, aqueles que dão notícias também lhes toca a eles." Este tipo de discurso, que tem um bocadinho de inveja e rancor, é uma coisa que se ouve muito e, por isso, tenho sempre receio de falar sobre o que me toca.
Ser jornalista foi um sonho de infância ou acabou por ser um acidente de percurso?
Foi completamente um acidente. Nunca tinha pensado no assunto até ter posto os pés no Armazém Bananas [onde agora é a SIC] há precisamente 21 anos, porque começámos a trabalhar em junho. Mas fosse qual fosse a profissão que escolhesse ia sempre divertir-me à brava, mesmo que fosse jardineira ou varredora de rua. Mas aquilo que gostava de ter sido era pintora, embora não tenha muito que ver.
E porque é que acabou por não seguir esse sonho?
Porque tive sempre pais muito sensatos, que me puseram os pés no chão, mas assim que comecei a trabalhar fui logo para o curso de Belas Artes. Tive cinco anos a fazer desenho de modelo em estúdio porque o que gosto mais é do corpo humano. No trabalho que faço em televisão acabo por encontrar esta paixão porque também trabalho e conto histórias através de imagens, embora seja diferente.
E entretanto como é que vai parar à SIC?
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Num táxi, sentei-me em cima de um papel de jornal e quando ia a tirá-lo reparei que era um anúncio. Naquela altura não se falava no aparecimento de uma TV privada e no anúncio isso também não era referido. E acabei por ir porque quando estava na faculdade já escrevia textos para jornais e até fui atriz.
Já foi atriz? Essa era uma faceta que desconhecia...
Quer dizer, é um bocado ridículo colocar as coisas assim. Fiz teatro. Mas se tivesse seguido a carreira de atriz tinha de ser cómica. Fiz teatro na faculdade, mas cheguei a representar no Teatro da Comuna [risos]. Era uma espécie de faculdade paralela, o teatro. E estava com o grupo embrionário que deu origem às produções fictícias, portanto, estava muito bem acompanhada e isso motivou muito a minha capacidade de rir. O riso sempre foi muito importante na minha vida. Ver o lado cómico das coisas é fundamental. Tenho de me conter para não estar sempre a rir.
Mas voltando ao anúncio, acha que estava destinada que iria para a SIC?
Não, não sou dessas coisas. Até podia ser, como matéria para história é mais empolgante imaginar que houve ali um diabinho que colocou o anúncio naquele táxi. Sim, porque só pode ter sido um diabinho [gargalhada]. Mas nunca imaginei que iria para a SIC porque na altura já tinha acabado a faculdade e estava a dar aulas de Inglês e Alemão. Adorava aquilo que fazia e já me estava a sentir professora para toda a vida. Ainda hoje, quando encontro os meus alunos, fazemos uma grande festa.
Pegando no título do programa Ir É o Melhor Remédio, qual acha que é, afinal, o melhor remédio para Portugal?
[risos] Se alguém soubesse a resposta para isso não estávamos como estamos. É uma pergunta difícil. Para mim, o melhor remédio é continuar a ativar o entusiasmo pelas coisas. A melhor resposta que encontrei até agora está na arte e na criatividade de resolver os problemas.
DN
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