Aos 14 anos vivia em Vale da Laje, Tomar, e não via televisão porque a aldeia não tinha eletricidade. Começou a trabalhar nas férias escolares para ajudar os pais a pagar os estudos. Hoje, é o comentador que traduz por miúdos o que os governantes andam a fazer ao país. Nas redes sociais querem elevá-lo a primeiro-ministro. Ele agradece, mas recusa. Diz que lhe falta "competência técnica".
Vamos começar já pelas faturas.
Ui! isso é uma guerra [gargalhada].
Em declarações recentes à NotíciasTV disse que guarda todas as faturas. Quando vai beber um café ao bar da SIC pede fatura?
Sim. Eles já sabem. Têm lá um papelinho com o meu nome e tiram logo a fatura.
Quando é que começou a recolha?
Desde que comecei a trabalhar, embora nos primeiros anos essa recolha não fosse tão sistematizada. Tenho as faturas todas organizadas e guardadas na minha garagem.
Por que começou tão cedo?
Por uma questão de princípio e para obrigar os agentes económicos a pagarem os seus impostos. Há ainda outro aspeto, as faturas registam os locais onde estive e quando foi isso. Digo coisas sobre certas personalidades e há tentações. Podem construir-se situações que não correspondem à verdade e o esclarecimento será mais fácil com o registo de consumo, presença e por aí fora...
Faz a sua própria contabilidade?
Sim. Faço a minha contabilidade e de alguns familiares porque me dá gozo e devo estar no interface com as instituições que nos governam, com as quais todos nós temos um relacionamento como contribuintes do ponto de vista microeconómico. Organizo o que tem que ver com contribuintes e administração fiscal, contribuintes/beneficiários da Segurança Social e coisas relacionadas com fornecedores de bens e serviços. Quando me aparece uma conta de 300 euros e o habitual é 50/60 vou reclamar.
Qual é o melhor negócio em relação à eletricidade, ao operador de TV?
Tenho sido um descuidado [risos]. Tenho um operador que me fornece o serviço de TV e outro que me fornece internet, telefone fixo, móvel e pré-pago das minhas filhas. Devia ter posto tudo num único operador, mas por pura inércia não o fiz. Em relação à eletricidade deixei-me ficar na EDP, com a tarifa universal, para ver até onde é que vão com as nossas contas e até que ponto vai o descaramento nos sucessivos aumentos. Estes vão continuar num mercado que dizem querer liberalizado, mas que para nós, consumidores, significa: aumentos, aumentos.
Vem aí mais um aumento?
Aumentaram em janeiro e em março, mas em julho não tiveram lata para isso. Estou a usar a palavra lata conscientemente, ou seja, em bom português porque é uma ousadia tirar-nos mais dinheiro do bolso.
Já se atrasou a entregar o IRS ou qualquer outro imposto?
Sim. Acontece-me deixar passar o prazo. Gosto de cumprir, sem ser um extremista porque há coisas mais importantes na vida. Um alemão é mais radical, é capaz de deixar de fazer qualquer coisa para ir a correr cumprir um prazo. Mas gosto da raiz alemã do cumprimento de horários e dos compromissos. Por exemplo, se combino uma coisa hoje para daqui a um ano, às nove da manhã, num certo local, para mim é sagrado. Estarei lá.
Já pagou multas?
Sim. Por entregar o IRS fora do prazo e uma coisa ou outra de que agora não me lembro.
E já conseguiu encontrar uma forma de fintar o Estado e pagar menos imposto?
Não é fintar o Estado, atenção! Depende da perspetiva [risos]. Há o planeamento fiscal agressivo que passa a fronteira da legalidade e começa a configurar comportamento de evasão. Isso não. Mas há o planeamento fiscal legal e a possibilidade de aproveitar o que está na lei. Isso sim. As pessoas não aproveitam o que está na lei por inércia, comodismo e porque são mal informadas.
Como por exemplo?
A dedução do IVA em IRS. Vi muito comentador da nossa praça dizer que a dedução do IVA em IRS não serve para nada e que apenas se deduz 250 euros. Quem disse isso não explicou que esses 250 euros são abatimento direto ao imposto que se paga. Ao juntar faturas que permitem abater 250 euros ao imposto, se a taxa de tributação efetiva da pessoa for de 25 por cento, significa que essa pessoa está a retirar da tributação, do seu rendimento bruto (retirado à tributação sem nenhum imposto), mil euros. Ninguém explica isto, mas é a realidade.
Não há quem diga mal dessa medida?
Já vi comentadores muito encartados dizerem mal desta medida. Eu peço que a estendam a tudo o que é consumo. Não apenas restaurantes, hotelaria e oficinas, mas vestuário, calçado, têxteis para o lar e tudo mais que permita deduzir o IVA pago nesta compras em IRS. Com esta medida não só o IVA é entregue ao Estado por quem o recolhe - que na maior parte dos casos fica com ele nos bolso - como tem de pagar o correspondente em IRC e isso é muito importante.
O que impede que a medida seja aplicada?
Há muita gente que entra pelos gabinetes dos nossos ministros e secretários de Estado e que continua a dizer: "Ai, ai, ai, que assim o setor vai à falência." Mas que diabo! Aquele dinheiro não é deles. É nosso. Fomos nós que o entregámos.
Teve duas ações mas perdeu-lhes o rasto
Joga na bolsa?
Eu não.
Nunca teve ações?
Comprei duas ações na minha vida, do jornal Público, em 1990, enquanto a generalidade da equipa comprou uma. Quando me perguntaram porque é que tinha comprado duas respondi: "É para o caso de uma se estragar." Conclusão, estragaram-se as duas. Nunca mais lhes vi o rasto e ninguém me pagou de volta. Mas atenção, o Público é um projeto muito importante, um projeto editorial interessante.
Nunca foi acionista do BPN, portanto?
Eu não! Nem de nenhum outro banco.
Os bancos são fiáveis ou é melhor guardar o dinheiro debaixo do colchão?
Não há nenhuma dúvida sobre a fiabilidade dos bancos. Arranjámos dinheiro por financiadores institucionais que o emprestaram à República e esta, por sua vez, emprestou ao setor financeiro. Estamos a falar de BCP, BPI, Banif e Caixa Geral de Depósitos, esta instituição diretamente, os outros indiretamente via empréstimo da troika. Nós ajudamos a salvar 60 por cento do sistema financeiro. Toda a gente só tem uma coisa a fazer que é pôr o dinheiro no banco.
Em que bancos?
Nos bancos portugueses. É lá que o nosso dinheiro está bem. Andam para aí uns senhores a dizer que o melhor é pôr o dinheiro nos bancos alemães em Portugal. Isso porque se houver uma saída do euro, o dinheiro estará a salvo. É pura mentira. Se houvesse uma saída do euro, que não vai haver, todas as contas dos bancos estrangeiros em Portugal tituladas por depositantes portugueses seriam convertidas em escudos novos. O que andam a dizer é ficção. Alguém quer dar dinheiro a ganhar a alguém.
Como tem tanta certeza de que não vamos sair do euro?
Porque os alemães não nos deixam. No dia em que sair Portugal, sai a Grécia, a Espanha, a Itália e os alemães vão vender a quem? Ao polo norte? Os alemães têm 40 por cento do seu comércio para a Zona Euro, mais 20 por cento para o espaço europeu fora do euro, mas que beneficia muito com a existência do euro, e os restantes 40 por cento com o resto do mundo.
Queimar pestanas para se informar
Os comentários na TV fazem-no sentir poderoso?
Eu não [gargalhada]. Pelo contrário, em casa quem decide é a minha mulher, entre familiares é tudo tomado por decisões de consenso, na empresa onde trabalho estou sempre a perguntar: "O que achas disto ou achas daquilo?"
Nem pelo alcance das suas palavras?
Isso já é diferente. Por vezes, o que eu digo tem efeito. Não posso fazer aquela posição da falsa modéstia, nem me ficaria bem. Tenho o poder de chegar a muita gente através da palavra e a eficácia da mensagem é constante. De resto, não me sinto poderoso do ponto de vista político, económico, social, cultural.
Como é que se prepara?
Queimando as pestanas a ler de manhã ou à noite, aos fins de semana, nas férias, para me informar. Guardo na memória exemplos de vida, desde o mais simples ao poderoso empresário, até ao cidadão que tem dificuldade em pagar as contas, passando pela pessoa mais exótica do ponto de vista das suas ideias. Exemplos que me chegam por carta, e-mail ou abordagem na rua.
As pessoas pedem-lhe dinheiro e conselhos como investir o dinheiro?
Às vezes, mas evito essa abordagem. Dou conselhos no sentido de terem atenção a tudo o que os bancos propõem. Se não pedirem ao Banco de Portugal o descritivo do produto financeiro, o qual deve lá ter a palavra "depósito", podem correr um risco, pois aplicam 100 euros e passados uns meses têm lá apenas 70. Recomendo cuidado em investir na bolsa, em ações de risco ou fundos de investimento especulativos. De resto, não digo mais nada porque pode reverte-se contra mim, jornalista. Os adviserse as casas de investimento é que são pagos para dar conselhos.
Sente que o seu segredo está em ser opinativo e usar uma linguagem acessível?
Não tenho segredo. É uma maneira de estar na vida. Tento adaptar a complexidade dos temas e das opiniões de modo a torná-los percetíveis pelas pessoas. Pelo retorno que tenho a mensagem chega. Aliás, nem posso usar uma linguagem complexa porque não sou economista, financeiro ou especialista em assuntos fiscais.
Quando é que sentiu pela primeira vez que não podia continuar a ser isento e tinha de dar opinião? Foi com a crise?
Antes disso. Todos nós somos cidadãos antes de sermos jornalistas, médicos, polícias, magistrados ou deputados. Enquanto jornalista, ao saber que a discussão orçamental do primeiro trimestre deste ano é uma desgraça porque tem 10% de défice, não estarei a fazer bem o meu papel se não disser que não é bem assim. Que foram corrigidas muitas coisas. Devo explicar às pessoas o que se está a passar.
Como convive com as críticas de que é maleável ao governo?
Houve uma vez que saí da antena e tinha um e-mail de um espectador que me dizia: "Você está feito com o governo. Só está a dizer bem deles. É porque tem interesses." Fiz o seguinte, fui a um e-mail do dia anterior, em que uma pessoa me fazia estas acusações: "Você quer dar cabo do governo. Quer deitar isto abaixo. Está a ser hipercrítico." Fiz cópia do primeiro e-mail, sem revelar a fonte, e reenviei ao segundo, dizendo: "Aprecie por si próprio." Já respondi a críticas dizendo: "Meu caro, a direita pensa que sou da esquerda e a esquerda pensa que sou da direita. E é o melhor elogio que podem fazer-me."
Nas redes sociais também é alvo de críticas...
Quando o governo faz bem digo isso. Devo ter sido dos poucos jornalistas que disseram que o anterior ministro da Economia [Álvaro Santos Pereira] estava a resolver bem vários dossiês, mas pressionado por lobbies. Ele cortou em parcerias público-privadas e em rendas de energia, tentou criar uma rede de gasolineiras low cost, entre outras coisas. Mas quando o mesmo ministro veio anunciar um projeto de contentores na Trafaria, eu disse que ia favorecer os mesmos interesses financeiros e imobiliários de sempre. Uns disseram que estava a favorecer o governo, outros que estava a deitar o governo abaixo. Convivo muito bem com as críticas.
Mesmo quando foi acusado de ter sido um dos obreiros intelectuais da vitória ao PSD em 2011?
A mim nunca me disseram isso, nem me lembro de o ter lido nas redes sociais. Mas convivo muito bem com esse tipo de observações. De tal maneira que, quando nos quiseram aplicar uma Taxa Social Única (que passava de 11 para 18 por cento), passados apenas vinte minutos de a decisão ter sido anunciada, disse em antena: "Querem dar um bónus às grandes empresas e aos bancos que nos retiram dinheiro dos nossos bolsos. Se isto é favorecer o governo... "
Por outro lado, há várias páginas no Facebook a pedir para ser primeiro-ministro. Está preparado para chegar ao governo?
Não. Eu não posso fazer parte de um governo porque não tenho competência técnica para isso. Nem devo pensar nisso sequer. Não me fica bem. Vejo com muito respeito e agradeço essas iniciativas no sentido de que são um reconhecimento do meu trabalho.
Nem para ser ministro das Finanças?
São funções muito técnicas e exigentes. É preciso o chamado networking, quem está neste cargos tem de ter uma rede de contactos muito boa na Europa do euro, nos centros financeiros, nos centros decisórios mundiais, nas instituições. Tem de ser formado na área, ter conhecimentos técnicos aprofundados, um reconhecimento académico, empresarial e profissional reconhecido no próprio país. Não tenho isso. Não é o meu campeonato.
Mas todos esses critérios que enunciou são suficientes para ser ministro das Finanças?
Não. Há uma coisa que falta, que é o bom senso e o sentido das proporções.
O que é que isso quer dizer?
Houve sucessivos ministros das Finanças do PS e do PSD que perderam o sentido das proporções. Todos os ministros que permitiram parcerias público-privadas, contratos ruinosos na área da energia, autoestradas e construções de hospitais.
Já sentiu muitas pressões?
Eu convivo tão bem com pressões [risos]. Uma vez fiz um trabalho sobre uma matéria muito agreste: patrões que atiram as suas empresas para a falência, ou seja, falências fraudulentas. Num dos casos, por coincidência o empresário era um amigo do patrão, Francisco Pinto Balsemão, mas não digo o nome. Depois de recolher toda a matéria contactei o senhor, que não me respondeu e o departamento de relações públicas também não. Porém, um familiar do senhor telefonou-me e disse-me: "Porque é que anda a incomodar o meu papá com patetices. O meu papá vai falar com o seu patrão". Eu respondi-lhe: "Faça favor". Dois dias depois a reportagem estava no ar e disse que um dos visados não quis falar. Podia ter dito que houve uma tentativa de pressão por parte de um familiar, mas preferi não o fazer. Nunca cheguei a saber se falou com o meu patrão, que é um grande senhor da comunicação social. Ele nunca me disse nada, como também nunca disse em relação a outros casos.
Fala-se tanto de crise. Afinal, é real ou foi introduzida pela comunicação social?
É real, embora haja quem diga que os jornalistas é que fazem a crise. Isso é prejudicial para o país e leva à alienação das pessoas. Há quem se dirija a mim e me diga: "Eu não vejo os noticiários". Digo-lhe: "Faz mal, muito mal. Se não vê noticiários, não se informa. Se não se informa não pode decidir e outros decidem por si." A ideia de que os jornalistas é que fazem a crise e os noticiários estão cheios de coisas negativas é mentira. E passo a explicar...
Explique, então...
Os alinhamentos dos noticiários televisivos têm na primeira parte, sobretudo nos primeiros 20 minutos, a factualidade da taxa de juro que subiu, da dívida que cresceu, da discussão orçamental que foi pior do que se pensava. Mas também das exportações que até subiram, ou da economia que evoluiu no sentido positivo. Esta é a realidade.
Está a referir-se em concreto ao noticiários da SIC?
Sim, e referindo-se mais especificamente aos noticiários da SIC e da SIC Notícias, eles estão cheios de coisas positivas. Na segunda parte, em especial, relatam casos de empresas de sucesso. As pessoas que acham que os jornalistas é que fazem a crise estão a ser injustas porque o processo de formação da memória atende aos primeiros vinte minutos dos noticiários.
"Perdi 20 a 25 por cento de poder de compra"
No que é que já cortou por causa da crise?
Em muita coisa. Reduzi o meu orçamento familiar, por causa da redução de salário, que também tive, e da redução de rendimento por via de mais impostos, seja diretamente no IRS ou indiretamente na tributação do consumo. Perdi muito poder de compra, já devo ir com 20 a 25 por cento, como a generalidade dos portugueses. Mas não me queixo. Tenho paciência. Estamos cá para ajudar a resolver os problemas do país. Queixo-me sim quando vejo alguns setores e algumas empresas a viver como se não houvesse crise, com projetos megalómanos para fazer museus na frente ribeirinha do Tejo e gastar mais uma dezena de milhões à nossa custa. Fico indignado com essas coisas. Todos nós devíamos impedir essas loucuras e pôr essas empresas a pagar a crise. O Sr. Fernando Urich já veio dizer publicamente que devia ser agora "aplicado um imposto sobre as grandes empresas porque é agora que todos nós precisamos do contributo delas". Se isso não acontecer, elas vão continuar a viver como se não houvesse crise e cada vez nos cobram mais impostos.
Quando vai às compras ao supermercado tem em conta o preço dos produtos?
Sim, sempre.
Compra produtos de marcas brancas?
Às vezes. Tenho sempre em atenção uma relação de qualidade/preço, que nem todas as marcas brancas resolvem. Tem de ser caso a caso.
Já foi de férias?
Fui cinco dias úteis e voltarei a ir agora em meados de agosto.
E está a pensar ir para a Comporta brincar aos pobrezinhos?
[Risos] As pessoas deviam medir as palavras. Às vezes pode não haver uma intenção de ofender, mas todos nós temos a responsabilidade das nossas palavras. Desde o mais simples cidadão ao mais abastado. Não se pode e não se deve usar certos termos que constituem uma ofensa para quem tem dificuldades.
Faz férias cá dentro ou fora?
Cá dentro sempre que posso, mas também é bom ir lá fora porque nas férias estuda-se e aprende-se muito. Levo as minhas filhas lá fora porque é um investimento e não lazer. Elas devem olhar o mundo. Se puder escolher a companhia aérea portuguesa faço-o sempre. Já cheguei a trocar bilhetes de primeira classe de uma companhia aérea estrangeira por bilhetes de segunda da TAP. Gosto de comprar produtos portugueses e de contribuir para a economia do meu país. Tive agora de pintar a minha casa e comprei tinta de uma empresa nacional.
Li numa revista que as suas filhas [Mariana e Daniela] estão agora a fazer um curso de inglês em Londres. Aproveitou a embalagem do primeiro-ministro o fez-lhes o discurso da emigração?
Eu tenho uma ideia muito própria sobre isso. Houve uma deturpação intencional do que o primeiro-ministro disse. Eu sou o primeiro a dizer: jovens deste país não olhem para este mercado de dez milhões de consumidores, olhem para um mercado de 500 milhões na Europa, de 385 milhões na América do Sul, de 340 milhões nos Estados Unidos, além do Médio e do Extremo Oriente.
Está também a fazer um convite aos jovens para emigrarem?
Não. Estou a convidar os portugueses que se querem formar a exercer o seu trabalho em qualquer parte do mundo porque o retorno para Portugal, esse virá sempre. Podemos ganhar a vida onde quer que estejamos e o nosso país será sempre ajudado.
Formou-se em Comunicação Social. Quando e porquê se especializou em Economia?
Quando houve muitos políticos a desdizer-se e a mudar de opinião em público. Essas atitudes não me agradam. Por outro lado, há realidades que são transformadas em números e , por isso, essas realidades são mais sólidas. É como a água do rio que passa e a água pode ser as palavras. E as rochas que ficam, que podem ser os números.
Foi sempre um bom aluno e rebentava com as notas a Matemática?
Não. Às vezes tinhas boas notas, outras nem por isso. Ser bom aluno a uma determinada disciplina não é uma regra para a vida. Vamos adquirindo outros conhecimentos e características.
Qual foi o seu primeiro emprego?
Na revista Classe, que foi a primeira publicação especializada em economia. Quase ao mesmo tempo comecei também a trabalhar na rádio TSF.
A sua mulher também é da área económica?
Não. Trabalha numa empresa de formação em informática e novas tecnologias. Fez algumas interrupções na carreira quando nasceram as nossas filhas.
Como foi a sua infância e adolescência na aldeia de Vale da Laje, Tomar?
Tenho um irmão e trabalhávamos bastante nas férias, primeiro para ajudar os pais, depois para pagar os estudos. Fiz o curso superior com o dinheiro que ganhava a trabalhar nas férias. Nos últimos anos da faculdade, trabalhava três meses e estudava outros três, de modo a fazer os exames.
Em que é que trabalhavam?
Em tudo e mais alguma coisa, às vezes em trabalhos duros, mas sem perderem a dignidade. Os meus pais eram pessoas humildes da aldeia. Não lamento nada, pelo contrário. Passei a ter outra atitude perante a vida, em que conto apenas comigo próprio e com a família, quando esta pode. Não renego o meu passado.
O seu irmão o que faz hoje?
Tem uma empresa na região, de Tomar.
Viver com nome de escritor
Como é que tem sido viver com o nome de escritor, logo você que sonhava ser escritor?
Durante muitos anos, ainda era estudante, assinei alguns artigos como José Ferreira. Mas já havia um José Ferreira e quando comecei a trabalhar mudei para José Gomes. O Adelino Gomes, nosso colega, quando soube o meu nome, passou a chamar-me José Gomes Ferreira. Um dia perguntou-me: "Porque é que só usas o nome José Gomes." Respondi-lhe: "Para não imitar o escritor." Ele disse-me: "Deixa-te disso, tu tens esse nome, qual é o problema?" A partir daí passei a usar o nome José Gomes Ferreira sem complexos e as pessoas começaram a conhecer-me assim.
Falando de outro colega, José Rodrigues dos Santos diz que não vota há vários anos para não se sentir influenciado? Você vota?
Voto sempre. Todos nós temos de votar e escolher. Há 1001 maneiras de demonstrar o nosso desagrado com a governação. Não votar é a menos eficiente e a mais prejudicial. Pode levar a que muita gente ganhe ideias e dizer: "Eles não querem saber e nós tomamos conta disto". É assim que começam as ditaduras e não nos venham com a história de que a Europa não iria permitir cá uma ditadura. Se não votarmos, estamos a dar azo a que qualquer dia alguém pegue em armas, manipule a opinião pública e tome de assalto o poder. E depois como é que é? Somos todos culpados, só que ninguém assume.
O voto é secreto?
Não sou radical. Está na consciência de cada um. Quem diz que vota em determinado partido não deve ser impedido.
Você diz em quem vota?
Não, não. Não digo e nem nunca direi porque tenho uma responsabilidade especial. Digo é que há gente com boas ideias em todos os partidos, mas que alguns projetos políticos, apesar de terem boas ideias, nunca seriam exequíveis. E não posso dizer mais do que isto...
Este país ainda tem solução?
Tem. Assim nós tenhamos consciência dos problemas, façamos as melhores escolhas para as aplicar.
A TVI parece estar as fazer as melhores escolhas e continua na liderança, a SIC...
[Interrompe] Tem dias. Mas não devemos vangloriar-nos quando ganhamos. Às vezes, ganha a concorrência, outras ganhamos nós, tanto no entretenimento como na informação. Todos os dias é tudo construído a partir do zero e essa é que é a atitude correta.
Mas o que falta na SIC que, apesar de várias estratégias, contratações, reformulações - e está prevista mais uma para o daytime -, não consolida o primeiro lugar?
Desculpe, desculpe, não quer que substitua a minha administração, o meu diretor-geral, o meu diretor de Informação. Sei bem o meu papel.
O que mudou na Informação desde que os jornalistas de economia começaram a dirigi-la? Você é subdiretor de Informação Diária, Paulo Ferreira é diretor de Informação da RTP?
Há cerca de 20 anos ninguém da televisão que se fazia em Portugal ligava a fiscalistas e a economistas. Há cerca de 20 anos, vou usar a primeira pessoa do singular, passei a entrevistar regularmente para as minhas peças e reportagens economistas, fiscalistas, especialistas de matérias que eram chatas. Demos o nosso contributo, sem falsas modéstias, para essas pessoas serem ouvidas na sociedade portuguesa. Há jornalistas de economia que percebem o que vai acontecer ao país com seis meses de antecedência porque as grandes decisões de gabinetes, às vezes, vêm nos relatórios e contas e no que os gestores dizem em linguagem de gestão, e que os especialistas conseguem antecipar.
E o que trouxe de novo à TV?
Trouxe mais espectadores, sobretudo, espectadores comprometidos com a busca de melhores soluções para o país. Não só para a SIC, que inovou nesta área, como para todos os operadores, mas os jornais e as agências já faziam esse trabalho de noticiário económico.
NotíciasTV
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